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Distrito Califórnia-Ceará

A Califórnia

 Nome dado à grande e rica fazenda de criação no sertão de Quixadá, pertencente ao Sargento-Mor Miguel Francisco de Queiroz Lima, um dos “Irmãos Queiroz”, casado com sua prima, D. Maria da Penha Queiroz, irmã de D. Joanna Batista de Queiroz Barreira, viúva de Luciano.



“Pelo ano de 1880, em pleno sertão cearense, na freguesia de Quixadá e Ribeira do Choró, florescia a Califórnia, grande fazenda de criação e fértil sítio de lavoura, com engenho de cana, aviamentos de farinha e abundantes colheitas de algodão e de cereais, provida de bom açude e servida por numerosa escravatura.

Fundada havia cinquenta anos, pelo sargento-mor Miguel Francisco de Queiroz e sua mulher Maria da Penha de Queiroz, diligentes e econômicos, a rica fazenda prospera notavelmente durante os trinta e um anos de invernos regulares, intercalados das secas de 1845 e 1877, o mais longo período de fartura observado na região.”

Esperidião de Queiroz Lima  –  Reminiscências



Nos tempos coloniais quando a família representava o principal elemento de organização econômica e social, fortemente congregada para a conquista de seus haveres e defesa de seus direitos, as amizades e alianças eram consolidadas pelos casamentos, que constituíam assim verdadeiros pactos de união e de solidariedade.

Entre os filhos do Capitão Antonio Pereira de Queiroz Lima, da Fazenda Casa Forte, e os filhos do Tenente Ignácio Lopes da Silva Barreira, do Tapuiará, havia, alem do parentesco, pois eram primos carnais, muita estima e convivência, porquanto se visitavam assiduamente.
Dessa amizade resultaram três casamentos entre as duas famílias: Antonio Duarte de Queiroz Lima, Miguel Francisco de Queiroz Lima e Mariana de Jesus Queiroz Lima, casaram-se respectivamente com os irmãos Maria Ignácia Lopes Barreira, Maria da Penha Lopes Barreirae Balthazar Lopes Barreira.

Miguel Francisco de Queiroz Lima e D. Maria da Penha Queiroz,foram os fundadores da fazenda Califórnia.



O Ouro



A fazenda Califórnia, durante muitas décadas foi considerada a maior e a mais importante fazenda da região, onde seus donos levavam uma vida patriarcal, assistidos por um capelão e servidos por escravaria privilegiada pelo trato magnânimo que lhe era dispensado, em retribuição ao inestimável proveito econômico advindo de seu trabalho.

Miguel Francisco e sua mulher Maria da Penha haviam se estabelecidos inicialmente no Junco, fazenda igualmente rica e produtiva, na ribeira do rio Sitiá, divisando com as águas do rio Choró, no sertão de Quixadá. Depois ele adquiriu umas terras vizinhas às suas extremas, a sesmaria pertencente a Domingos Lopes Delgado, ficando assim possuidor de enorme extensão de terras propícias para plantações e criação de gado.
O casal de fazendeiros empenhou-se com entusiasmo a fim de estabelecerem ali uma bela propriedade. E dentro em pouco estava formado um verdadeiro povoado, ao lado da capela construída em 1855.
As terras férteis produziam em tão grande abundancia algodão, cana de açúcar, mandioca e cereais, que na vizinhança só se falava na riqueza dessas terras. Um dia, um dos sobrinhos do velho Miguel Francisco, chamado José Severiano de Queiroz, o mais velho da irmandade de Santa Maria, que morava na Fazenda Barro Vermelho, depois vendida ao Coronel José Marinho Falcão (meu bisavô paterno), comentou que o tio havia descoberto uma “nova Califórnia”, mais rica que a da América do Norte que estava a produzir tanto ouro... E logo que o tio soube desses comentários, agradeceu pela lembrança da comparação e disse:



“– Eu estava mesmo procurando um nome bonito para a minha fazenda, pois fica sendo – Califórnia!”



E assim surgiu a fazenda e o novo povoado de Califórnia, sob a proteção e orago de São Francisco de Assis, padroeiro da capela.

Miguel Francisco e D. Maria da Penha não tiveram filhos. Diligentes, trabalhadores e parcimoniosos, possuíam muitos escravos que viviam como libertos, formando suas famílias que habitavam confortáveis moradias, instaladas em casas de tijolo e telha, caiadas e ladrilhadas. Bem alimentados viviam satisfeitos, trabalhando com muito gosto e total dedicação a seus senhores.
Era grande a renda e muito pouco a despesa. Os escravos produziam todos os alimentos consumidos ali e os pequenos utensílios usados nos serviços da fazenda. Ferreiros, fiandeiros e tecelões escravos produziam as ferragens necessárias, fiavam e teciam os panos de algodão que todos vestiam, inclusive as redes de dormir. Até o sal era trazido das praias de Cascavel (hoje Beberibe) onde viviam seus primos praianos, nos sítios Lucas e Bom Jardim.
Miguel Francisco não pegava em dinheiro de papel, “que era sujo”, nem de cobre, “que azinhavrava”. Era condição de toda transação ou venda que ele fazia: que o pagamento fosse feito em OURO ou PRATA, que ele recebia em moedas da época, em jóias ou em barra. E nunca se soube que o velho fazendeiro houvesse despendido qualquer parcela desses metais preciosos continuamente arrecadados.
Na falta de bancos e caixas-fortes, a maneira mais segura de se guardar toda essa riqueza acumulada em anos de trabalho e economia, seria enterrar em um local secreto. Seu cofre era a princípio uma caixa de ferro que logo foi substituída, segundo a versão corrente da época, por uma mala feita de cedro, coberta com sola e enfeitada com taxas de metal amarelo, que foi enterrada em lugar ignorado.  O segredo do esconderijo só era sabido, alem dos donos, pelo velho e fiel escravo João Miguel, que havia jurado pela salvação de sua alma guardar sigilo absoluto até a morte.
Deve existir na fazenda Califórnia, em algum lugar, uma mala velha enterrada, cheia de ouro, prata e muitas jóias, cujos proprietários levaram para o túmulo esse segredo.
Assim, se antes a Califórnia não possuía ouro no subsolo, este o recebeu depois e talvez ainda hoje o guarde em suas entranhas...



A Herança



 Arcelino de Queiroz Lima (avô de Arcelino Queiroz de Mattos Brito), era sobrinho do velho Miguel Francisco, filho de seu irmão Pedro de Queiroz Lima e de Francisca Helena Rosa de Lima, residentes no Sítio Bom Jardim, em Cascavel (hoje município de Beberibe). Nascido em 22/01/1837, nesse Sítio Bom Jardim, formou-se em Direito pela faculdade de Recife no final de 1871 e, em 20/01/1872 casou-se com Rachel de Queiroz Lima, filha do coronel Baptista de Guaramiranga. Fundou o “Gymnásio Cearense” na Praça dos Voluntários, em Fortaleza, que funcionou em um prédio particular onde depois se estabeleceu o Liceu. Ingressou no serviço público e exerceu vários cargos por um breve tempo, pois preferiu entrar para a magistratura. Nomeado Juiz Municipal de Canindé, foi logo promovido a Juiz de Direito de Pacatuba e passou a residir numa bela propriedade, localizada no sopé da Serra da Aratanha.

Certo dia achava-se o Dr. Arcelino em seu pitoresco sítio quando ali chegou um cavaleiro trazendo-lhe um recado:



“– Eu venho da Califórnia e trago um recado do Sr. Miguel Francisco para o Dr. Arcelino.

– Que manda dizer o meu tio Miguel?
– Vou repetir as palavras dele: “Rifane, vá a Pacatuba e diga ao meu sobrinho Dr. Arcelino, que se alguma coisa lhe mereço, venha ver-me com toda urgência.” E foi só.
– Meu tio Miguel de mim merece tudo. Decerto que irei visitá-lo sem demora. Está ele doente?
– Não, senhor! Goza boa saúde, apesar dos seus oitenta e oito anos contados.”



 Arcelino e Rachel ficaram conjeturando acerca desse estranho chamado do velho tio rico do sertão e, no dia 31/12/1879 Arcelino chegou à Califórnia. No dia seguinte Miguel Francisco revelou o motivo de seu chamado: ele e sua esposa queriam fazer-lhe a doação da fazenda Califórnia e constituí-lo único herdeiro de todos os bens do casal, com uma condição: deveria vir morar na fazenda, fazendo-lhes companhia e tomando a direção de todos os negócios enquanto eles vivessem. Explicou que já se sentia velho e cansado, incapaz de gerenciar suas fazendas. Não tinham filhos e também não queriam ver suas propriedades fragmentadas e repartidas entre os inúmeros herdeiros. Assim haviam escolhido o sobrinho que mais parecia merecer, capaz de proporcionar ao casal de velhos um final de vida confortável e tranquila.

Arcelino se propôs a gerenciar os negócios e fazer-lhes companhia, independente de qualquer herança. Mas o tio obstinado mandou vir de Quixadá o Tabelião José Enéas Monteiro Lessa que passou as escrituras conforme suas determinações.

Arcelino e Rachel trouxeram para a Califórnia três filhos pequenos:Adelaide (minha bisavó materna), João Baptista e Pedro, com apenas um ano de idade (falecido criança, em 1888, de febre amarela, em Fortaleza). No dia 31/10/1880, nasceu na Califórnia um menino, filho do Dr. Arcelino de Queiroz Lima e de D. Rachel de Queiroz Lima, o qual se chamou Esperidião e foi batizado na Capela de São Francisco de Assis, tendo como padrinhos Miguel Francisco e D. Maria da Penha, sendo levado à Pia Batismal por sua irmã Adelaide, com apenas sete anos de idade.
Em 1882, Arcelino acabava de chegar de uma viagem à Fortaleza quando lhe informaram que Miguel Francisco não estava bem e queria vê-lo imediatamente.
Ao entrar no quarto viu que o tio passava mal, estava lívido e ofegante, sentindo uma dor forte no peito, apenas murmurou:



“– Tenho uma coisa importante a revelar-te...”



Dirigiu um olhar entre os que estavam ali presentes, fazendo com a mão um gesto para que se retirassem. Nisso levou as mãos ao peito e tombou desfalecido. Talvez um edema agudo pulmonar tenha cortado a existência de seus noventa anos já completos.

Qual seria a revelação que Miguel Francisco não pôde fazer? Todos acreditaram que fosse o segredo do local onde a mala de ouroestaria enterrada.
Enquanto era velado o corpo de seu velho tio, Arcelino passou toda a noite desse dia sentado à mesa, escrevendo: lavrou e assinou como procurador do tio, oitenta e duas cartas de alforria, libertando todos os escravos que lhe caberiam de herança, livrando-se assim do imposto de transmissão da propriedade servil que não desejava conservar. Tornou-se então, secretamente, um grande libertador de escravos. Depois disso promoveu o casamento religioso e a legitimação de todos os filhos dos ex-escravos.
D. Maria da Penha viveu mais um ano, tratada pelos sobrinhos e herdeiros com a mesma dedicação e o carinho que sempre tiveram para com a tia, e o maior escrúpulo de inquirí-la sobre o paradeiro da mala. Mas outros sobrinhos vindo visitá-la, não deixavam de interrogá-la a respeito, ao que ela lhes respondia:



“– Deus não quis que ele falasse e eu respeito a vontade daquele homem e a de Deus...”



Miguel Francisco e D. Maria da Penha foram sepultados na entrada da capela que ergueram na povoação da Califórnia.

A família da Califórnia cresceu muito. Alem de Adelaide, nascida em 05/03/1873, João Baptista, nascido em 20/07/1875 e Pedro (falecido criança), nasceram depois aí os outros filhos do casal: Mário, em 29/05/1882, Esperidião*, em 31/10/1880, Eusébio, em 19/05/1884,Daniel, em 03/02/1886, Pedro, em 08/02/1889, Beatriz, em 04/06/1892, José Arcelino, em 12/09/1893 e Arcelina, em 1º/05/1895.
O Dr. Arcelino reconstruiu a Igreja, que é o mais antigo templo da paróquia de Quixadá, e a casa onde vivera seus velhos tios, removendo todo o ladrilho e descobrindo os alicerces, na esperança talvez de encontrar o tal tesouro, mas até hoje continua o mistério da mala de ouro escondida...



 











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